sábado, 1 de agosto de 2009

ATESTADO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS



Uma prática utilizada por alguns organismos empresariais na fase de seleção e recrutamento de empregados é o da exigência de apresentação de "atestado de antecedentes criminais". Tal prática além de repudiável importa em riscos ao próprio organismo empresarial.


A Constituição assegura o direito à igualdade dentre os direitos fundamentais, bem como, condena qualquer prática discriminatória. Sobretudo, é assegurado a todos o livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas às qualificações profissionais que a lei estabelecer.


Não havendo em regra permissivo legal para a exigência do atestado, afigura-se ilegal a sua exigência por importar em prática discriminatória passível inclusive de indenização por danos morais do ofendido.


Para algumas profissões*, todavia, a inexistência de antecedentes criminais é condição para o exercício da profissão, mas, frise-se, tal condição é prevista em lei.


* Lei 7.102/83: Art. 16 - Para o exercício da profissão, o vigilante preencherá os seguintes requisitos: (...)VI - não ter antecedentes criminais registrados (...)

DIREITO DO TRABALHO - TESTES ADMISSIONAIS


É na fase de seleção que a empresa tem a oportunidade de verificar as aptidões do empregado para o cargo oferecido. Nesta fase a empresa poderá efetuar testes para verificar as qualidades do empregado no desempenho de tarefas inerentes à função pretendida. Referidos testes são denominados como "testes admissionais", sendo cada vez mais utilizados pelos organismos empresariais, bem como, regulados através de pactos coletivos a sua legalidade.




Tratam-se os "testes admissionais" de simulações de situações cotidianas que irá enfrentar o candidato no desempenho da função caso seja contratado. Um "teste admissional", no entanto, não pode resultar em beneficio econômico para a empresa sob pena de configurar o enriquecimento ilícito e a conseqüente obrigação de remunerar o trabalho desempenhado.




Testes de digitação em uma empresa de processamento de dados, ou de serviço de mesa para o candidato a garçom em um restaurante, são exemplos de "testes admissionais" permitidos e razoáveis a aferir as qualidades do candidato.




Por último, caso o "teste admissional" não seja bastante para avaliar as qualidades do candidato, a empresa poderá ser valer do contrato de experiência, no entanto, neste caso passa a ser obrigatório a formalização do contrato de trabalho havendo incidência de encargos trabalhistas.

Palestra Cananéia



No último dia 25 de julho, a convite da Colônia de Pescadores de Cananéia, litoral sul de São Paulo, estive palestrando para os pescadores artesanais sobre o tema "exercício da cidadania". Tive a possibilidade de discorrer sobre a importância cultural, histórica e econômica da pesca artesanal; o dever do pescador artesanal de ser um fiscal do exercício da sua profissão e, também, do meio ambiente; o seu direito de continuar exercendo a pesca artesanal.



Conversamos sobre a história das Colônias de Pescadores, sua criação no século passado subordinada à Marinha de Guerra e a criação do atual Ministério da Pesca e da Aqüicultura, denotando a importância do pescador artesanal de participar da vida das colônias, meio pelo qual poderá assegurar de fato o seu espaço no Ministério ao lado da aqüicultura e da pesca industrial, ambas, modalidades pujantes e que têm se apresentado como alternativa bastante viável para o aproveitamento do potencial pesqueiro nacional.



No final deste mês, estarei na AMPE de Araquari, palestrando para os micro e pequenos empresários sobre direito do trabalho em companhia do Dr. Felipe, advogado associado do nosso escritório. Estou ainda delimitando o tema, mas o tópico principal será os cuidados que devem ser observados pela empresa na contratação de empregados.

Fw: REFIS DA CRISE: INTERPRETAR É SIMPLES




Por Emerson Souza Gomes, advogado sócio da Pugliese e Gomes Advocacia






No último dia 23 foi publicada no DOU a Portaria nº 6 que regulamenta a operacionalização do "Refis da Crise", o qual possibilita aos contribuintes o parcelamento de débitos para com a Procuradoria da Fazenda Nacional (PGFN) e a Receita Federal do Brasil em até 180 meses.





Podem ser objeto de parcelamento, desde que vencidos até 30/11/2008, débitos com a Receita ou a PGFN; saldos remanescentes de outros programas de parcelamento; assegurando-se, inclusive, a possibilidade de pagamento parcelado de débitos ajuizados e daqueles inscritos ou não em dívida ativa.





O novo Refis foi bastante complacente com o contribuinte-devedor, fato este que não deve ser recebido como um "favor fiscal", mas como a concretização de um direito, consagrado na Constituição que submete a tributação ao principio da dignidade e sabemos: A carga tributária imposta ao setor produtivo é indigna e demonstra em números que o Estado brasileiro ainda muito deve caminhar para se transformar em um Estado Cidadão.





Neste ponto, surge a crítica à Portaria que prevê não estarem incluídos no parcelamento os débitos relativos ao Simples Nacional.





Com respeito à interpretação do fisco, em nenhum momento a Lei 11.941 (Lei do Refis da Crise) traz tal limitação, excluindo o micro e o pequeno empresário, que tenha aderido ao simples nacional, da possibilidade de parcelamento. Trata-se, assim, de uma surpresa desagradável, sobretudo pelo fato de que uma "portaria" não pode limitar os efeitos de uma Lei.





Conclui-se, deste modo, que a interpretação dada pelo fisco à lei do Refis caminha na contramão do que entendeu ideal o Congresso Nacional para preservar a higidez da economia frente à crise econômica, o que poderá acabar engrossando a pauta de trabalho do Poder Judiciário através de uma leva de medidas judiciais.





Por fim, muito se tem postulado por uma reforma tributária condigna, através da simplificação dos mecanismos de arrecadação e da diminuição da carga tributária, no entanto, no atual momento, protagonizado pela Lei do Refis da Crise, vê-se que a reforma que se quer deve partir de uma mudança de postura da própria administração pública com relação à aplicação da legislação que hoje temos em vigor, afinal de contas, sempre haverá várias interpretações para um mesmo texto de lei e para o fisco: "Interpretar é simples!".

Fw: REFIS DA CRISE - PORTARIA CONJUNTA Nº 6

Fazenda normatiza parcelamento de débitos junto à PGFN e RFB

O Diário Oficial da União (DOU) publica na edição de 23 de julho de 2009 a Portaria Conjunta nº 6, que dispõe sobre o pagamento e o parcelamento de débitos junto à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), parcelados ou não, com vencimento até 30.11.2008, de que tratam os arts. 1º a 13 da Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009. Poderão ser pagos ou parcelados, em até 180 meses, inclusive, o saldo remanescente dos débitos consolidados no REFIS (Programa de Recuperação Fiscal), PAES (Parcelamento Especial), PAEX (Parcelamento Excepcional) ou no parcelamento ordinário. Mesmos débitos já excluídos desses parcelamentos estão abrangidos pela lei.

A medida atinge também:

  • os débitos decorrentes do aproveitamento indevido de créditos de IPI oriundos da aquisição de matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários relacionados na TIPI (Tabela de Incidência do IPI), com incidência de alíquota zero ou como não-tributadas; e

  • débitos da COFINS das sociedades civis de prestação de serviços.

Não estão abrangidos os débitos relativos ao Simples Nacional, devidos pelas microempresas e empresas de pequeno porte.

Os requerimentos de adesão aos parcelamentos ou ao pagamento à vista com utilização de prejuízo fiscal ou de base negativa de CSLL deverão ser protocolados exclusivamente nos sítios da PGFN ou da RFB na Internet, www.pgfn.fazenda.gov.br ou http://www.receita.fazenda.gov.br/, com utilização de certificado digital ou código de acesso, a partir do dia 17 de agosto de 2009 até as 20 horas (horário de Brasília) do dia 30 de novembro de 2009. O pagamento à vista que não considere a utilização de prejuízo fiscal ou de base negativa de CSLL é auto-aplicável desde a publicação da Lei e independe de formalização de adesão. O valor de cada prestação será acrescido de juros correspondentes à variação mensal da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) para títulos federais a partir do mês subsequente ao da consolidação até o mês anterior ao do pagamento e de 1% para o mês do pagamento. As prestações vencerão no último dia útil de cada mês, devendo a primeira prestação ser paga no mês em que for formalizado o pedido.

Estão previstas as seguintes condições:

Pagamento à vista para todos os débitos, inclusive para aqueles que já foram objeto de parcelamentos anteriores

REDUÇÕES

MULTA DE MORA E OFÍCIO

MULTAS ISOLADAS*

JUROS DE MORA

ENCARGO LEGAL**

100%

40%

45%

100%

* Multas não vinculadas diretamente ao não pagamento de tributos

** Honorários advocatícios.

Parcelamento para débitos que não foram em nenhum momento objeto de parcelamento

No caso de opção pelo parcelamento, a prestação mensal não pode ser inferior a:

  • R$ 2.000,00, no caso de parcelamento de débitos decorrentes do aproveitamento indevido de créditos do IPI oriundos da aquisição de matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários relacionados na TIPI;
  • R$ 50,00, no caso de pessoa física; e
  • R$ 100,00, no caso dos demais débitos da pessoa jurídica, ainda que o parcelamento seja de responsabilidade de pessoa física.

Implicará rescisão do parcelamento e remessa do débito para inscrição em DAU ou prosseguimento da execução, conforme o caso, a falta de pagamento: de três prestações, consecutivas ou não, desde que vencidas em prazo superior a 30 dias; ou a partir de uma prestação, estando pagas todas as demais. A prestação paga com até 30 dias de atraso não configura inadimplência para os fins rescisórios.

Modalidade:

REDUÇÕES

MULTA DE MORA E OFÍCIO

MULTAS ISOLADAS*

JUROS DE MORA

ENCARGO LEGAL**

Em até 30 parcelas mensais

90%

35%

40%

100%

Em até 60 parcelas mensais

80%

30%

35%

100%

Em até 120 parcelas mensais

70%

25%

30%

100%

Em até 180 parcelas mensais

60%

20%

25%

100%

* Multas não vinculadas diretamente ao não pagamento de tributos

** Honorários advocatícios.

Parcelamento para débitos que já estão ou estiveram na situação de parcelado (REFIS, PAES, PAEX e Ordinários)

Os contribuintes que aderiram ao REFIS, PAES, PAEX e Parcelamentos Ordinários poderão migrar para uma das modalidades de parcelamento regulamentado pela Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 6. Nesses casos, a adesão implicará na desistência compulsória e definitiva desses programas. A parcela mínima, nesse caso, será equivalente a:

  • REFIS: 85% da média das prestações devidas entre os meses de dezembro de 2007 a novembro de 2008; ou 85% da média das parcelas devidas no Programa antes da edição da Medida Provisória no 449, de 3 de dezembro de 2008 (exclusão ou rescisão em um período menor que 12 meses);
  • PAES – PAEX – ORDINÁRIO: 85% do valor da prestação devida no mês de novembro de 2008; e
  • débitos provenientes de mais de um parcelamento: somatório das prestações mínimas definidas para cada parcelamento.

Débitos anteriormente

incluídos no:

REDUÇÕES

MULTA DE MORA E OFÍCIO

MULTAS ISOLADAS

JUROS DE MORA

ENCARGO LEGAL

REFIS

40%

40%

25%

100%

PAES

70%

40%

30%

100%

PAEX

80%

40%

35%

100%

DEMAIS PARCELAMENTOS*

100%

40%

40%

100%

* Referentes os débitos anteriormente incluídos em parcelamento de contribuições devidas à Seguridade Social (art. 38 da Lei nº 8.212, de 1991) e do parcelamento ordinário dos débitos de todos os tipos de tributos federais (arts. 10 a 14-F da Lei nº 10.522, de 2002).

Download da apresentação conjunta da Receita Federal e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, sobre a normatização de parcelamento de débitos.

Ouça aqui a entrevista coletiva com as equipes da PGFN e da RFB.

FONTE: PGFN / RFB / GMF – 22/07/2009

domingo, 26 de julho de 2009

STF concede liminar suspendendo decisão da Justiça do Trabalho de Joinville






Para o Ministro Ricardo Levandoski do Supremo Tribunal Federal, a base de cálculo para o pagamento do adicional de insalubridade é o salário mínimo, ao contrário do que entendeu devido o Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Joinville, ao julgar reclamatória trabalhista condenando a empresa ao pagamento de adicional de insalubridade como base no piso salarial da categoria. A empresa recorreu ao Supremo Tribunal Federal, obtendo liminar que suspendeu os efeitos da sentença.





O que é o "adicional de insalubridade":





Conforme a CLT "Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos" (art. 189).





Como se calcula o adicional de insalubridade:





O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40%, 20% ou 10% do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio e mínimo. (art. 192)





Qual a controvérsia jurídica:





Se o adicional deve ser pago com base no piso salarial da categoria que é superior ao valor do salário mínimo.





Qual o teor da decisão do Ministro do STF:





Para o Ministro, o adicional de insalubridade deve ter por base de cálculo o salário mínimo, tendo em vista o disposto na Súmula Vinculante nº 4 do STF:





"Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial"





A decisão na íntegra:





"Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, proposta por Oficina Cruz Car Neto LTDA, contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Joinville/SC na Reclamatória Trabalhista 05866-2007-028-12-00-1, por inobservância da Súmula



Vinculante 4 desta Corte.





Alega a reclamante que a sentença de primeira instância determinou a alteração da base de cálculo do adicional de insalubridade do salário mínimo para o piso salarial da categoria, contrariando a referida súmula vinculante.





Pugna pela concessão da medida liminar para que seja suspensa a decisão objeto desta Reclamação e, no mérito, pela sua procedência.





É o relatório.





Passo a decidir o pedido liminar.





Em uma análise perfunctória dos autos, verifico que estão presentes os requisitos que ensejam a concessão da liminar.





O verbete da Súmula Vinculante 4, indicada como paradigma afrontado, recebeu a seguinte redação:





"Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial"





O RE 565.714/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, um dos precedentes que deu origem a essa Súmula foi assim ementado:





"EMENTA: CONSTITUCIONAL. ART. 7º, INC. IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO-RECEPÇÃO DO ART. 3º, § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR PAULISTA N. 432/1985 PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988. INCONSTITUCIONALIDADE DE VINCULAÇÃO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE AO SALÁRIO MÍNIMO: PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE DA MODIFICAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO BENEFÍCIO POR DECISÃO JUDICIAL.





RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. O sentido da vedação constante da parte final do inc. IV do art. 7º da Constituição impede que o salário-mínimo possa ser aproveitado como fator de indexação; essa utilização tolheria eventual aumento do salário-mínimo pela cadeia de aumentos que ensejaria se admitida essa vinculação (RE 217.700, Ministro Moreira Alves). A norma constitucional tem o objetivo de impedir que aumento do salário-mínimo gere, indiretamente, peso maior do que aquele diretamente relacionado com o acréscimo. Essa circunstância pressionaria reajuste menor do salário mínimo, o que significaria obstaculizar a implementação da política salarial prevista no art. 7º, inciso IV, da Constituição da República. O aproveitamento do salário mínimo para formação da base de cálculo de qualquer parcela remuneratória ou com qualquer outro objetivo pecuniário (indenizações, pensões, etc.) esbarra na vinculação vedada pela Constituição do Brasil. Histórico e análise comparativa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Declaração de não recepção pela Constituição da República de 1988 do Art. 3º, § 1º, da Lei Complementar n. 432/1985 do Estado de São Paulo. 2. Inexistência de regra constitucional autorizativa de concessão de adicional de insalubridade a servidores públicos (art. 39, § 1º, inc. III) ou a policiais militares (art. 42, § 1º, c/c 142, § 3º, inc. X). 3. Inviabilidade de invocação do art. 7º, inc. XXIII, da Constituição da República, pois mesmo se a legislação local determina a sua incidência aos servidores públicos, a expressão adicional de remuneração contida na norma constitucional há de ser interpretada como adicional remuneratório, a saber, aquele que desenvolve atividades penosas, insalubres ou perigosas tem direito a adicional, a compor a sua remuneração. Se a Constituição tivesse estabelecido remuneração do trabalhador como base de cálculo teria afirmado adicional sobre a remuneração, o que não fez. 4. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento" (grifos no original).



Como se vê, é defeso ao Judiciário estabelecer novos parâmetros para base de cálculo do adicional de insalubridade.



Conforme se pode depreender da decisão proferida na Reclamação Trabalhista 05866-2007-028-12-00-1, a autoridade reclamada determinou a substituição do salário mínimo pelo piso salarial da categoria, o que afronta, em tese, a Súmula Vinculante



4.



Isso posto, defiro o pedido de medida liminar para suspender a decisão reclamada.



Requisitem-se informações.



Após, ouça-se a Procuradoria-Geral da República. Publique-se. Brasília, 16 de junho de 2009.



Ministro RICARDO LEWANDOWSKI – Relator





Fonte: Reclamação 8.183 (STF)







Academia Brasileira de Direito - ABDIR


Aplicação do princípio da boa-fé objetiva aos contratos de seguro de vida

Emerson Souza Gomes

1. IntroduçãoA despeito da presença no ordenamento jurídico da boa-fé objetiva como princípio norteador dos contratos e da caudalosa jurisprudência expendida pelos Tribunais afirmando que a má-fé do segurado, quanto as suas declarações, deve ser robustamente provada, têm, por vezes, empresas seguradoras e subsidiárias de instituições financeiras que operam no ramo securitário, alegado impropriamente o motivo da doença pré-existente como óbice à liquidação da importância segurada no caso do evento morte natural do segurado.Com fundamento na legislação pertinente, na doutrina e no comportamento jurisprudencial, o presente artigo compila inteligência favorável ao pagamento da indenização avençada, considerando que, nos contratos de seguro onde há por parte da seguradora a dispensa de exame médico prévio, é indiferente para a liquidação da obrigação o estado de saúde do segurado quando da celebração do contrato e sim, a qualidade da sua declaração, ou seja, se de boa ou má-fé.2. Sobre a boa-fé nos contratos de seguroCom o advento da novel legislação civil, iluminada pelo princípio da “eticidade”, a boa-fé passou a ser guia de conduta dos contratantes, obrigando uma conduta arrimada na retidão de proceder, dessumindo-se desta deveres de lealdade e solidarismo, dentre outras virtudes. Aliás, após o Código, a boa-fé passou a ser analisada objetivamente, ou seja, não com base nas qualidades dos contratantes, mas num agir ordinário, no que efetivamente a sociedade espera da conduta do homem médio nos seus negócios habituais.Consoante a redação do art. 442 “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé.”. O laureado Silvio de Salvo Venosa, enfatiza o princípio da boa-fé como dever das partes contratantes: “Coloquialmente, podemos afirmar que esse princípio se estampa pelo dever das partes de agir de forma correta antes, durante e depois do contrato. Isso porque, mesmo após o cumprimento de um contrato, podem sobrar-lhes efeitos residuais.” [1] Especificamente, no que concerne aos Contratos de Seguro, o artigo 765 do Código traça como azimute à conduta dos contratantes a boa-fé: “O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, assim a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.”Conforme Cláudia Lima Marques “os contratos de seguro foram responsáveis por uma grande evolução jurisprudencial no sentido de conscientizar-se da necessidade de um direito dos contratos mais social, mais comprometido com a equidade, boa-fé (...).(...) há de se presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.” [2]Linha esta presente no Código de Proteção e Defesa do Consumidor que literalmente, alça a boa-fé como princípio norteador da política nacional de relações de consumo, precisamente no seu art 4º, III. Em comento ao dispositivo, ainda na letra de Cláudia Lima Marques: “Poderíamos afirmar genericamente que a boa-fé é o princípio máximo orientador do CDC;” [3]Denote-se que a doutrina colabora para que, primordialmente, presuma-se a boa-fé do consumidor. Vejamos ainda: “As linhas de interpretação asseguradas pela jurisprudência brasileira aos consumidores em matéria de seguros são um bom exemplo da implementação de uma tutela especial para aquele contratante em posição mais vulnerável na relação contratual, antes e depois da entrada em vigor do CDC. Aqui há de se presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e se impor deveres de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.” [4]Bem assim, oportuna a letra do tratadista Arnaldo Rizzardo, que em sua obra “Contratos”, acentua: “Mas não basta a mera constatação de um fato não revelado para desvincular do encargo de indenizar. A má-fé deverá ficar provada, ônus que incumbe ao segurador. Interpreta-se em favor do segurado a avença em casos de dúvidas e omissões. E se o segurado, ao fazer as declarações, não obrou de má-fé, subsiste a obrigação da indenização”.Ademais, justifica o tratadista: “É que a seguradora se apóia nas perspectivas favoráveis que resultam das previsões atuariais. Sabe, de antemão que, entre os segurados, dispensada a cautela do exame médico, poderá haver alguns doentes e até gravemente enfermos. O risco, todavia, é coberto com largueza pela vantagem proveniente do grande número de segurados que aderem ao sistema de seguro, e não padecem o infortúnio. Constituem dados de presunção de que a seguradora, voluntariamente, dispensa o exame e aceita o risco: a idade do segurado, a profissão, o regime e a espécie de trabalho exercida, e a compleição física e mental. [5]”Assim, em sintonia legislação e doutrina asseveram a boa-fé contratual como princípio norteador, tanto das relações consumeirista, como das demais relações privadas, evidenciando o dever da seguradora de comprovar a má-fé do segurado quando da contratação do seguro.Sobretudo, inteligência conectada à presunção de inocência, disposta no art.5º da Constituição Federal.3. Sobre o comportamento jurisprudencialNão diferente tem sido o entendimento dos Tribunais. Em arestos colacionados adiante, no espírito e letra da novel legislação privada e do Código do Consumidor, verifica-se que a seguradora somente se vê desobrigada a adimplir ao pacto no caso de comprovada a má-fé do contratante.“12154 - SEGURO DE VIDA - Prescrição. Doença preexistente. Má-fé. Ônus da prova. Art. 585, III, do CPC. O contrato de seguro é título executivo extrajudicial, consoante o art. 585, III, do CPC. O art. 178, § 6º, II, do CC regula o prazo prescricional apenas da ação do segurado e vice-versa, não sendo lícito aplicar-se o mesmo preceito aos beneficiários do seguro. É vedado à seguradora recusar-se ao pagamento do valor da apólice de seguro de vida sob alegação de doença preexistente, se não comprovar a má-fé do contratante, consubstanciada em declarações inverídicas quanto a seu estado de saúde, hipótese em que inaplicável o art. 1.444 do CC.” (TAMG - AC 226.398-9 - 7ª C - Rel. Juiz Lauro Bracarense - DJMG 24.05.97)“Se não demonstrado convincentemente ter o segurado agido de má-fé ou que a omissão, ao prestar informações, foi intencional, o contrato é válido, devendo a seguradora efetuar o pagamento do benefício. Dispensando a seguradora, no contrato, exame médico, há que se crer na palavra do segurado, cabendo àquelas provar a má-fé deste. Em caso de dúvida, resolve-se em favor do segurado “(JC 72/395)” (AC n. 97.015052-0, de Blumenau, relator: Desembargador Anselmo Cerello).O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacifica a questão, configurando como omissa a conduta da seguradora que não exige exame para admissão de segurado.“Seguro-saúde – Doença preexistente – AIDS. Omissa a seguradora tocante à sua obrigação de efetuar exame de admissão do segurado, cabe-lhe responder pela integralidade das despesas médico-hospitalares havidas com a internação do paciente, sendo inoperante a cláusula restritiva inserta no contrato de seguro-saúde. Recurso conhecido em parte e parcialmente provido.” (STJ, Resp 234219/SP, 4ª Turma, Rel. Min.Ruy Rosado de Aguiar, j.15/05/2001) e Resp 300215/MG, 4ª Turma, Rel. Min.Aldir Passarinho Junior, j.29.05.2001, fonte: Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 394)Destarte, no tocante à conduta da seguradora em após ter firmado o pacto, obstaculizar-se ao pagamento da importância segurada deduzindo doença preexistente ou defeito na declaração do segurado, cabe ainda a nota da doutrina que assevera: “o direito contratual passa a realizar um controle da liberdade contratual, controle da liberdade do mais forte, proteção da liberdade do outro, do contratante mais fraco; controle sempre baseado nos princípios maiores da boa-fé objetiva e da necessária proteção da confiança na sociedade de consumo [6].”Nesta proteção, em a seguradora se subtraindo ao pagamento da indenização, mesmo tendo aceitado os riscos da omissão, não exigindo exames prévios de saúde, denota-se agressão à confiança mediana, conquanto ao fornecedor não é facultado propiciar surpresas ao consumidor.Cumpre assim concluir que, mesmo que preexistente, porém desconhecido o mal que adveio ao segurado, não tem a seguradora o direito de escusar-se ao cumprimento da prestação, posto que relevante à lei não é o estado material do segurado ao tempo do contrato e sim, a qualidade da sua declaração, ou seja, se de boa ou má-fé. Anote-se: "Havendo boa-fé quando da contratação do seguro, ainda que a enfermidade seja preexistente, a cobertura do risco pela seguradora é conseqüência do contrato" [7]Bem assim, eventuais diligências do segurado para o cuidado da saúde, não autorizam igualmente o não pagamento da importância segurada, muito menos ainda, podem configurar a má-fé do segurado quando da contratação do seguro.A jurisprudência acompanha a inteligência:“Seguro de vida em grupo – Falecimento do segurado – Se o segurado foi submetido a tratamento especializado, um dia após a contratação do seguro, tal fato por si só, não significa que o mesmo tenha agido com má-fé, ao subscrever a proposta de renovação do seguro de vida em grupo, como vinha fazendo durante longos anos. A data em que ocorreria o evento morte era incerta; além do mais, a doença se instalara no organismo do segurado em data bem anterior, na vigência de algum dos contratos de seguro que celebrou. E a má-fé não pode ser presumida, mesmo em se tratando de um contrato de seguro. Portanto, deve a seguradora arcar com o pagamento da indenização correspondente ao seguro, pois durante longos anos recebeu o prêmio e assumiu o risco pelo pagamento.” (1º TACSP – 2ª C. – Ap. Rel. Alberto Tedesco – j.03.08.94 – RT 715/170, fonte: Rui Stoco in Responsabilidade Civil e sua interpretação Jurisprudencial, 3ª edição, revista e ampliada, editora Revista dos Tribunais, pág.258)“Seguro de vida – Perda do direito – Inadmissibilidade – Morte decorrente de cirurgia cardíaca – Seguradora que alega que o segurado era portador de moléstia grave quando da assinatura da proposta, por ter-se submetido pouco tempo antes a exame de coronária e coração. Cateterismo que constitui exame para diagnóstico e não síndrome – Segurado, ademais que levava vida ativa – Má-fé não caracterizada – Verba devida – (...)” (1º TACSP – 4 C.Esp. – Rel.Roberto Mendes de Freitas – j.31.1.94 – RT 715/170, fonte: Rui Stoco in Responsabilidade Civil e sua interpretação Jurisprudencial, 3ª edição, revista e ampliada, editora Revista dos Tribunais, pág.253)4. Conclusões:Do alinhado, havendo contratação de seguro de vida, com dispensa de exame médico prévio, constata-se evidente o direito do beneficiário do seguro em haver da seguradora o valor contratado como importância segurada para o evento morte natural, sendo independente uma apreciação do estado de saúde do segurado no ato da contratação, importando tão somente a qualidade da sua declaração, como já fixado, se de boa ou má-fé.Consoante a jurisprudência e a doutrina, cabe à seguradora a prova de má-fé do segurado quando da contratação do seguro, sobretudo, em função da presunção constitucional de inocência.Por último, a má-fé deve restar evidenciada de forma contundente, não importando como prova de má-fé, diligências do segurado para cuidados da sua saúde.[1] www.societario.com.br[2] Claudia Lima Marques in Contratos do Código de Defesa do Consumidor, o novo regime das relações contratuais, 4ª edição. Editora Revista dos Tribunais, 2.002, p. 394[3] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 671[4] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 394 e 395[5] Arnaldo Rizzardo in Contratos, 2ª edição, editora Forense, 2001, p.546[6] Cláudia Lima Marques in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, O novo regime das relações contratuais, 4ª edição, 2..002, editora Revista dos Tribunais, pág. 593[7] Revista Jurisprudência Mineira, v. 36, p. 227-232. Sobre o texto:Texto inserido na Academia Brasileira de Direito em 27 de junho de 2006.

Bibliografia:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:GOMES, Emerson Souza. Aplicação do princípio da boa fé objetiva aos contratos de seguro de vida. Disponível em Acesso em :26 de julho de 2009

Autor:
Emerson Souza Gomes
emerson@pugliesegomes.com.br
Advogado em Joinville (SC). Especializando em Direito Empresarial pela Universidade do Vale do Itajaí

Academia brasileira de direito, 27/6/2006